sexta-feira, 20 de janeiro de 2012
Flores de molho em água benta
Dois dias depois, ouvi o senhor do quiosque comentar que alguém tinha deixado na igreja flores de molho em água benta, com a etiqueta comercial original onde se podia ler:
"Orquídeas Phalaenopsis Poltergeist. Encherão a sua casa de vida. Olhe por elas e elas olharão para si. Regar semanalmente."
quarta-feira, 18 de janeiro de 2012
Dentro dos champôs
segunda-feira, 16 de janeiro de 2012
Pelo lince embalsamado
sábado, 14 de janeiro de 2012
A apanhar o seu sapato
Certo dia, quando desapareceu o gato da vizinha, ele assumiu a tarefa de espalhar dezasseis anúncios - no tronco da mesma árvore. Uma vez sonhou com portas cheias de narizes, e acordou de madrugada com uma ideia: pegou em todos os perfumes da sua mulher e no seu after shave, misturou-os com azeite e aguardente dentro de um pote, e regou a árvore com a mistura. Sentiu-se triunfante, achou que tinha conseguido irritar o vegetal que placidamente o observava do alto. Mas chegou a Primavera e a árvore encheu-se de folhinhas. Ela crescia, abençoada pela graça divina. O senhor Frederico ficava cada vez mais raivoso, à medida que os dias passavam. Já não dançava com a mulher no seu tapete favorito, porque achava que os seus pés não cresciam por culpa da árvore maldita. Então lembrou-se da provocação perfeita que iria coroar todas as suas pequenas vinganças e satisfazer, finalmente, toda a sua ira: dançar em cima da árvore. Içou o seu tapete favorito - roto e velho - para cima dos ramos, e no momento em que ia começar a dançar, caíram-lhe os sapatos ao chão e o pobre homem ficou pendurado por um ramo. "Estás a ver!", disse a mulher, que o observava do chão com as mãos nas ancas: "Fizestes-lhe judiarias e ela ainda te ampara." Rubicundo de fúria, o senhor Frederico exclamou: "Os meus sapatos!"
segunda-feira, 9 de janeiro de 2012
E era uma lâmpada
Há uns dias atrás, eu cheguei a casa, acendi as luzes, e tive a mesma sensação estranha que me arrepiava em alguns sonhos: reparei que elas não estavam propriamente acesas. A sua luz era baixinha, verde e vacilante. De repente, uma lâmpada fundiu. Havia uma janela aberta num quarto do fundo e o nevoeiro avançava para dentro de casa, transportando consigo um cheiro a pântano. Ouvi atrás de mim um tic, tic, tic. Olhei e era outra lâmpada. Mas alguma coisa nela parecia mexer-se. Aproximei-me, e estava, lá dentro, a cirandar freneticamente, um aranhiço patudo. "Detesto estes bichos", pensei. Desatarrachei a lâmpada e as outras todas voltaram à normalidade. Com a lâmpada apagada na mão, senti-me no direito de fazer perguntas. "Quem és?", inquiri. Dentro da lâmpada, a aranha mexeu e eu ouvi, baixinho:
- Sou Edison.
- Mas que disparate! - Bradei.
- Thomas Edison. - insistiu a criatura.
- Pois eu não acredito na reincarnação de génios em aranhas!
- Eu sou o génio da lâmpada e posso realizar três...
- Que tolice - interrompi - eu nem acredito nessas coisas!
Um bocado farto daquela cena, e com pouca vontade que se repetisse, dei a lâmpada ao meu vizinho, que vê mal e não reparou na aranha. Consta que a colocou na casa de banho e que funciona lindamente.
domingo, 8 de janeiro de 2012
Sejam de vespas ou de estrelas
A picada permaneceu no meio da minha testa durante uns dias. Depoi vinguei-me das vespas e li-lhes um opúsculo cosmológico de Vespácio Ferrão, que dizia, entre outras coisas:
"Enquanto que os livros abrigam insectos rastejantes como os bichos da madeira, o infinito aloja os enxames galácticos mais prósperos e abundantes."
E eu acrescentei: sejam de vespas ou estrelas.
Convencidas, e com razão, da finitude do meu quarto, voaram todas pela janela em direcção ao infinito e deixaram para trás o ninho cheio de larvas que eu tive de limpar e foi um nojo.
Eu a reparar naquelas coisas
Na noite seguinte, sonhei que havia cogumelos à mesa e que deitei alguns fora porque estavam estragados.