Na Rua da Tipografia Meireles
há um restaurante japonês que promove workshops
de origami e tem o seu abundante fornecimento de papel a partir dos restos da
tipografia. Eu fui recentemente a este resturante e apareci, sem intenção, a
meio de uma destas lições de origami. Havia apenas quatro pessoas no workshop: uma idosa russa com o cabelo
iluminado por lâmpadas de Natal (ligado a uma tomada clandestina), um rapaz de
uns treze anos com uma cábula de declinações de artigos gregos nos joelhos, um
cavalo lusitano e o professor japonês, que naquele momento manifestava o seu
ódio ou rivalidade contra o restaurante chinês do outro lado da rua. Pedi
educadamente à senhora russa para desligar a iluminação do cabelo, pois eu
corria o risco de ter um ataque de epilepsia. Dei uma cenoura com IVA ao cavalo
lusitano e expliquei ao miúdo que os artigos gregos não devem ser pechinchados.
Finalmente, o senhor japonês olhou para mim, ralhou-me com aquele modo
repentino dos orientais e tentou ensinar-me a fazer um caracol em origami, mas
eu deixei cair a concha ao chão e, nesse mesmo momento, ouvi berrar muito alto:
«Uma lesma! Mais uma lesma!» «Desculpe,» disse eu, «estou a tentar fazer isto o
mais depressa que posso…» Quando dei conta, era o chinês que saía da Tipografia
Meireles a correr desalmadamente com
dois grandes embrulhos nos braços. O japonês encolheu os ombros e explicou-me
que o chinês, por rivalidade, queria esgotar os restos de papel da tipografia e
cozinhava resmas de papel, que fazia
passar por carne de frango, de modo a que não houvesse sobras de papel para o
workshop de origami.
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